sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Reaja

Um dia Deus estava observando a terra – não vamos nos debater em conceitos teológicos é pra ser um texto bonito e não uma tese – ele observou toda a tristeza e dor que os homens estavam provocando um no outro. Aquilo machucava o coração de amor e por um instante ele pensou: “todos os meus filhos são assim?”

Enquanto isso, na terra, um homem acabava de admitir pra sua analista que ele era louco.

— Doutora... Eu... Eu realmente sou louco.

— Fale-me sobre. De onde tirou isso?

— Olha nosso mundo! As pessoas parecem não se importar uma com as outras. Vejo pessoas abandonadas nas ruas; em casas de abrigo. E os hospitais? As pessoas passam dias, algumas meses, entre idas e vindas, quartos estranhos, pessoas que pouco se importam com o que elas estão sentindo. Do que vale salvar o corpo se muitas pessoas saem dos quartos com as almas mortas? Eu não suporto mais viver com isso. Essas ultimas palavras foram ditas com a cabeça entre as mãos e as mãos entre lágrimas. O silêncio de sua analista o afligiu e levantando a cabeça ficou impressionado. Ela chorava convulsivamente, perdida entre manter-se sob controle e entregar-se aquela verdade. Era impossível estar ouvindo todas aquelas palavras. Não era o que tinha sonhado na noite anterior. Os dois abraçaram-se como dois amigos que se reencontram décadas depois. Do céu, Deus via tudo.

O coração de amor alegrou-se e ao mesmo tempo teve uma iluminação: “sei que eles se importam, mas vão precisar de ajuda.” Então ele separou para si quatro anjos; anjos especiais, que entre si tinham uma afinidade tão plena que mal se podia dizer onde um terminava e onde o outro começava. Os dois primeiros pareciam um só. Como yin-yang; como as duas faces da mesma moeda. Magros, altos e de cabelo curto; o mesmo instrumento musical, mas se fez dia e o outro se fez noite. Mantinham um ar sério e responsável, mas quando desciam a terra com suas roupas de amor eles conseguiam arrancar risos até de uma pedra. Infelizmente não consigo lembrar os nomes, mas é que não importa, sempre que você chamasse um o outro viria junto, afinal de contas “o cordão de três dobras nãos e pode quebrar.”

A terceira era uma anjinha linda (quanto ao sexo dos anjos discutimos depois). E do tamanho da sua beleza era o tamanho dos seus desastres. Era sempre assim: se levava os pratos, deixava a comida; levava a comida toda, esquecia os convidados, mas quando finalmente (e depois de um certo esforço) ele conseguiu o que precisava para ajudar, um sorriso maravilhoso encheu seu rosto. Um rosto belo, suave, mas isso tudo era por conta da alegria dela, afinal de contas “o coração alegre aformoseia o rosto.”

A ultima, e com toda certeza não menos importante, era uma anja de cabelos verdes, sim senhoras e senhores ela tinha cabelos verdes. Seu corpo parecia feito de cristal de tão frágil aparentava ser; era como se fosse preciso um cuidado extremo para que ela não se desfizesse ao mais leve toque. Na verdade isso era um grande engano; nunca, nem em mil era, uma coisa frágil poderia carregar tanta alegria como havia dentro dela. Era de um riso contagiante e sua voz parecia estremecer os corações de alegria. Sua cabeça funcionava numa velocidade tão rápida que ela nunca terminava uma piada do jeito certo, mas sua graça era tanto que todos acabavam rindo. Ela tinha uma voz maravilhosa; cantava como um coro de flores do campo, canta tão bela quanto os pássaros que ouço agora. Afinal de contas “tudo que tem fôlego cante.”

Agora eles estão aqui e lá, soltos por toda parte fazendo o bem e cumprindo a missão que lhes foi dada. São gente, ajudando gente, pra fazer um mundo diferente. Reaja.

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