quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Bom Dia Anjo

E era assim, não podia ser diferente. A primeira vez que vi você dormindo comecei a me questionar sobre a existência dos anjos. Você ainda estava nua e no seu corpo ainda restava o calor do nosso amor. Seus cabelos caiam delicadamente sobre seu rosto ocultando parte da sua beleza. Mas eu ainda conseguia ver, por entre os fios de sedas que eram seu véu de glória, seus lábios rosados e doces. Via seu nariz que parecia ter sido esculpido durante eras, pelo fluxo bendito de uma cachoeira de águas cristalinas. Seus olhos fechados não eram menos encantadores; que sonho estariam eles contemplando agora? Eu não sabia, mas desejava ardentemente fazer parte deles.

O lençol de cetim num tom claro (que você insiste em chamar de pérola, mas que para mim sempre será bege) cobria seus quadris, sem esconder suas formas acentuadas. Seus pés pareciam duas peças de porcelana, delicados, finos; mas como eram ligeiros na hora de correr de mim ou de subir numa arvore como uma moleca. Suas pernas eram as colunas de sustentação do tempo maravilhoso que era seu corpo, eram firmes e fortes, como suas opiniões nas nossas discussões. Suas costas eram a tabula rasa da minha felicidade, era possível erguer um reino sem fim sobre elas.

Deitei-me ao seu lado e Afrodite com delicadeza te repousou sob meus braços. Naquele instante, com suas vestes celestiais que pareciam encher todo o quarto, a deusa me disse:

- Que te importa no mundo?

- Ela.

- Dou-te terras que seus olhos nunca serão capazes de ver por inteiro. Que te importa no mundo?

- Ela, pois de nada me vale ter terras a perder de vista, se minhas vistas não puderem se perder nos olhos da minha amada

- Dou-te poder que nunca conhecerás o limite. Que te importa no mundo?

- Ela, porque não me importa ter poder que minha razão não conhecerá o limite, se está circunscrita no sorriso dela toda força que preciso para me levantar e amar.

- Dou-te a palavra absoluta, certeira e inefável; faço de ti artesão supremo das letras. Que te importa no mundo?

- Ela, pois não sei se entendes minha deusa, de nada vale ter uma palavra ideal ou todas elas, se não for para fazê-la sorrir.

E tendo dito isso a deusa evaporou-se diante de mim como a fumaça de um incenso doce, porém ciumento. Olhei e você ainda estava em meus braços; suas mãos repousaram sobre meu peito e eu podia sentir meu coração bater através delas. Seus braços tão longos quanto sua paciência comigo pareciam me proteger de qualquer mal do mundo, mesmo com você dormindo. Seus seios encostaram no meu corpo e eu pude sentir a maciez deles mais uma vez. Como eles estavam belos, como duas colinas férteis e inexploradas. Comecei a sentir o leve perfume que brotava da raiz de seus cabelos, fechei os olhos deixei meus sentidos serem tomados por você.

Despertei.

Um peso sem mais fim caiu sobre meu coração quando me vi sozinho sobre uma cama bagunçada. Meus braços vazios, a ausência da sua pele e do seu calor, era como se pudesse ouvir ao longe o riso do amor ciumento de Afrodite. Mas ao levantar meus olhos lá estava você, meu anjo transformado em mulher. Estava sentada vigiando meu sono, como fez nossa mãe Eva antes de Adão despertar do sono que Deus o colocara, para que ela pudesse existir. Seus olhos eram olhos vividos de paz, e despejavam sobre mim os sonhos que guardaram por toda a noite, e sim, eu era a tema da maioria deles.

O cetim agora te cobria toda, mas ainda podia sentir seu corpo me chamar de longe. Se anjos realmente existem ou não, não sei; mas se sim, com certeza você é um deles.


Te olhei, sorri e só pude dizer:

- Bom dia Anjo.

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